SOBRE O DESTINO DOS DADOS DIGITAIS

José Fernandes de Lima

Desconfio que o leitor desse artigo possui mais de duas contas digitais. Tem, pelo menos, uma conta no banco, uma conta de e-mail e uma nas redes sociais. Essas contas são protegidas por senhas e só podem ser acessadas quando a senha correta é fornecida.  A exigência de senhas visa fazer com que os dados fiquem protegidos e que somente o usuário consiga vê-los. Essa proteção faz sentido porque queremos guardar para nós os dados que consideramos importantes.

Algumas vezes essas informações são guardadas nos nossos dispositivos eletrônicos e outras vezes são guardadas nas nuvens, ou seja, nos computadores das grandes empresas. Estejam as ditas informações num canto ou noutro, o importante é que você faz de tudo para ter o controle sobre elas. Dependendo da posição ocupada pelo indivíduo, suas informações podem valer muito dinheiro. Nos dias atuais, há uma grande discussão sobre a privacidade. As pessoas desejam limitar os dados que as redes sociais guardam sobre elas.

No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados trata da proteção dos dados digitais das pessoas físicas e jurídicas, mas não trata especificamente do que deve acontecer com os dados das pessoas depois que elas morrem. A experiência tem mostrado que esse assunto requer maior atenção do que a dispensada até o presente momento porque o sistema de privacidade que funciona bem enquanto o individuo está vivo pode perder a eficiência quando ele vier a falecer. O leitor já pensou sobre o que deseja que aconteça com os seus dados digitais depois da sua morte? Se não pensou, eu sugiro que pense por que o assunto pode ser mais complexo do que parece.

As informações pessoais contidas nos ambientes digitais vão além das senhas das contas bancárias. Envolvem também as preferências e a história das pessoas. Para estudo hipotético, suponhamos o falecimento de um indivíduo que tenha, além da conta bancária, um canal no YouTube, um perfil no Facebook e uma conta no Twitter.  Já sabemos que, no caso do banco, o gerente só vai permitir que alguém movimente a conta do falecido depois que ficar provado que esse alguém é um herdeiro ou um advogado reconhecido juridicamente. Sabemos também que, a depender da família, isso pode demorar meses para acontecer. Apesar das dificuldades, o caminho a ser seguido já está bem estabelecido.

No caso das redes sociais, parece um pouco mais complicado. As empresas dizem que as informações do usuário continuam sendo dele, mesmo depois da morte. Afirmam que tais informações só podem ser cedidas aos parentes no caso de o usuário ter indicado previamente um herdeiro ou mediante autorização judicial. Se a conta for do tipo que o usuário tinha que pagar todo o mês, quando ele parar de pagar, a conta será bloqueada e ninguém mais poderá movimentá-la. Se a conta é uma dessas das redes sociais gratuitas, as informações do falecido continuarão lá por tempo indeterminado. É por isso que, de vez em quando, você recebe fotos, mensagens e até convites de pessoas que já morreram.

Se o falecido havia definido um herdeiro, este pode mudar a foto de perfil, pode fazer novas publicações e pode também transformar o site em um memorial. Quando a conta é transformada em memorial, ela deixa de ser oferecida para novas amizades e para de enviar mensagens. Se o herdeiro quiser e tiver autorização judicial, pode solicitar um download do conteúdo total e pode também pedir para apagar o perfil. Cada companhia tem um jeito de trabalhar e é por isso que já existem advogados especializados no assunto.  Algumas empresas como o Twitter costumam deletar as contas quando elas ficam inativas por muito tempo. No Facebook, além de desativar a conta, o herdeiro pode transformá-la em um memorial no qual o conteúdo que a pessoa compartilhou permanece visível, mas não pode ser acrescido.

Estamos diante de uma novidade que precisa ser encarada.  Pelo andar da carruagem, em poucos anos, deveremos ter mais memoriais do que contas de pessoas vivas. Por tudo isso, se você usa alguma rede social e deposita nela as suas informações, não deixe de verificar qual é a política dessa rede para o caso da morte do usuário. Essa cautela pode prevenir transtornos para os seus descendentes. Pode também evitar uma eternidade inconveniente.

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